12 de jun. de 2016

O poeta e a política
Nando da Costa Lima

Nando
Adson tinha três paixões… Isaura, poesia e política. Era o único farmacêutico poeta e político do interior de Minas, substituía o médico que não tinha e nem se pensava em ter naquele tempo. Isto o tornou muito conhecido e esta popularidade o levou a candidatar-se fazendo oposição a um dos homens mais ricos da região. O “coroné” Machadão tinha mais de mil alqueires de terra, isto sem contar a valentia dos que acham que dinheiro é sinônimo de hombridade. Pra Adson que estava iniciando na política era realmente um prato indigesto, o homem tinha influência em tudo na cidade. Quando Adson ia falar o comercial da farmácia no serviço de alto-falante, o coroné mandava desligar a “luz do motô”. Quando tinha alguma viajem urgente o homem dava um jeito de furar os pneus da marinete. Parecia coisa de criança… mas foi na época da política de palanque que o coroné Machadão deu a maior demonstração de força: uma semana antes do discurso de Adson na Praça da Matriz, Machadão saiu de casa em casa acompanhado de seu “três oitão” avisando pra ninguém ir assistir ao comício do jumento do Adson. O resultado foi o que se esperava: mesmo a população tendo uma grande admiração por Adson, ninguém era doido de desobedecer ao coroné. O comício foi um fracasso, além dos companheiros de partido só quem participou foi Isaura que era esposa do candidato e João Babão que era doido e tinha pavor do coroné. Acho que nem preciso dizer quem ganhou a política e muito menos a diferença de votos. Mesmo derrotado Adson não desgostou e continuou usando a farmácia como um eterno comitê, ele sabia que o tempo iria fazer o povo entender que a força bruta não pode com o bem. Chegou um tempo em que até parto ele fazia. Isto aumentava cada vez mais sua popularidade e foi através desse prestígio que se elegeu várias vezes vereador. O prefeito continuava sendo ou o coroné Machadão ou quem ele indicasse, Adson já tinha decidido não mais disputar a prefeitura enquanto o tivesse como adversário, era perda de tempo e dinheiro. O tempo passou… foram várias as políticas em que eles emendaram os bigodes verbalmente, mas como na política de tudo pode se esperar, o coroné Machadão se desentendeu com a ala jovem do partido da situação que sempre comandou e foi o jeito pular pro partido de Adson. Mesmo não concordando com a ideia o poeta político acabou concordando com o ingresso do inimigo para fortalecer a esquerda. Só que como o chefe da esquerda aproveitou pra fazer um acordo: só deixava o coroné entrar no partido se este o apoiasse para prefeito. Machadão não teve escolha, era a única maneira de provar para os moleques da ala jovem que ali só se elegia prefeito que ele apoiasse. Esta transferência de partido virou o assunto preferido dos moradores do lugarejo, nem a oposição nem a situação se conformavam em ver Adson e o coroné dividindo o mesmo palanque…

E chegou o dia do tão esperado comício de abertura, o coroné fez questão de falar primeiro como era de costume. Não perdeu tempo, pegou o microfone e rasgou a seda em homenagem ao ex-adversário: “Vocês devem votar num homem sério, intelectual e acima de tudo uma grande alma que vive pra poesia e para servir ao próximo…”. Quando ele acabou o discurso de duas horas elogiando Adson, um bêbado gritou no meio da Praça: “Mas nas políticas passadas o senhor só subia no palanque pra chamar Adson de jumento”. O coroné sem perder a pose respondeu já coçando o inseparável 38: “Chamei sim, só que Adson é um JUMENTÃO de raça, não é um jumentinho safado como você e o resto de sua família”.
E Adson acabou sendo eleito…

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